‘Estava acamado tomando morfina’, diz paciente após aval da Justiça para cultivar maconha
Especialistas estimam que ao menos 10 pessoas que entraram com ações já conseguiram autorização para o plantio no estado
Mais dois pacientes conseguiram na Justiça do Rio de Janeiro, nos últimos meses, habeas corpus preventivos para cultivo caseiro de maconha para fins medicinais, sem risco de serem presos pela polícia ou sofrerem qualquer tipo de importunação jurídica. Os dois têm hérnia de disco e alegam que as dores só diminuíram quando experimentarem o óleo de cannabis, após tentativas frustradas com tratamentos convencionais.
De acordo com especialistas que acompanham questões jurídicas semelhantes, existem cerca de 10 casos de autorizações no estado e aproximadamente 40 em todo o país. Procurada pelo G1, a Justiça do Rio informou que não possui um levantamento detalhado de habeas corpus preventivos.
Um dos contemplados pela decisão judicial é o investidor Douglas Santos*, que passou a plantar sua cannabis de forma orgânica e produzir o óleo de forma caseira, o que, segundo ele, melhorou em “mais de 200%” a sua qualidade de vida.
“Eu já não andava, os medicamentos normais que as pessoas tomam pra dor já não faziam efeito para mim. Sou um homem de 32 anos que estava acamado tomando morfina, praticamente um aleijado. Quando pude produzir meu próprio remédio, eu voltei a andar. Melhorou em 200% minha qualidade de vida”, explica Douglas.
Três comprimidos de morfina por dia
Ele diz que o meu tipo de hérnia que tem é incurável e que isso o deixa refém de analgésicos. “Tomava três comprimidos de morfina por dia e não estava mais dando jeito. O que é mais forte que a morfina? Nada. Foi então que o médico sugeriu essa alternativa com óleo de cannabis”, relembra.
“O auge foi um dia que eu não senti mais nada da cintura para baixo, eu tive a impressão que estava aleijado, acordei como se tivessem arrancado as pernas de mim, eu entrei em pânico, gritei, chorei.”
Douglas conta que três horas depois de tomar o óleo de cannabis conseguiu sentir as pernas. “A partir da segunda semana de uso contínuo do óleo não houve mais dor, travamento. Também houve aumento de apetite e diminuição da minha ansiedade. Hoje posso fazer artes marciais, trilhas. Antes, não andava em chão desnivelado que caía, hoje sou uma pessoa normal”.
O paciente consome de três a quatro frascos de 30 ml de óleo por mês e para iniciar o plantio, ele gastou cerca de R$ 20 mil com estufas, luzes, tubos. Apesar de o cultivo caseiro exigir conhecimento para plantio e investimento financeiro, Douglas conta que se fosse importar o óleo do exterior os gastos chegariam a R$ 10 mil mensais, muito acima do que ele tem atualmente: “Para mim, isso é inviável. Aí veio a ideia para reduzir esse custo com o plantio caseiro”.
Cultivar maconha é crime no Brasil
Luciano Cunha, advogado de Douglas, explica que é importante que o pedido na Justiça aconteça antes de o paciente começar o cultivo caseiro. “No Brasil, é crime cultivar maconha. Então os pacientes que necessitam do uso da cannabis para fins medicinais enfrentam o problema do valor para comprar o medicamento do exterior”, justifica o advogado.
O advogado explica ainda que por conta da necessidade dos pacientes, o poder judiciário e o Ministério Público estão atentos às demandas da sociedade.
“Os poderes estão notando também o avanço científico. A cannabis tem sido uma boa solução para determinadas patologias”, acrescenta Luciano. O advogado orienta que interessados no tratamento com cannabis busquem informações com a Anvisa e conversem com especialistas.
‘Nem todas as pessoas respondem bem’, diz médico
O especialista em dor e cirurgias na coluna Ricardo Ferreira explica que a cannabis é indicada para dores refratárias, que não não correspondem aos tratamentos convencionais como remédios, terapias e cirurgias.
“O tratamento com cannabis é indicado para qualquer patologia que limite a qualidade de vida da pessoa e quando existe a comprovação de que não existe para aquele paciente outra alternativa no mercado. No meu caso, prescrevo para pacientes que tenham dores e que já tentaram todos os métodos e continuam sofrendo”, pondera o médico.
Ricardo aponta ainda que a Anvisa regulamentou o uso compassivo da cannabis para fins medicinais desde 2015. Entretanto, para que seja concedida autorização para cultivo caseiro é necessária uma autorização da Justiça.
“Para os que fazem tratamento com cannabis, percebo alívio de dores, as pessoas conseguem voltar a fazer atividades, ter vida social, dorme melhor. Mas é importante ressaltar que como qualquer outro tratamento, a cannabis não funciona para todo mundo, nem todas as pessoas respondem bem a essa alternativa.”
O G1 procurou a Sociedade Brasileira de Ortopedia e Traumatologia, mas até a publicação da reportagem não recebeu retorno.
*O nome do paciente foi trocado para preservar sua identidade.
Fonte: Por Patricia Teixeira, G1 Rio - https://g1.globo.com/rj/rio-de-janeiro/noticia/2019/05/04/estava-acamado-tomando-morfina-diz-paciente-apos-aval-da-justica-do-rj-para-cultivar-maconha-para-uso-medicinal.ghtml
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